20 novembro, 2009

ÉVORA PATRIMÓNIO MUNICIPAL?

Pesquisando no tipo de alertas, reclamações, debates, queixas… deixadas na plataforma digital http://www.autarquias.org/, abaixo referida, encontrei referência a um protesto de um cidadão, que por sua vez remetia para um blogue, onde encontrei este pedaço de prosa que transcrevo em boa parte. São notáveis as semelhanças com outras preocupações manifestadas noutros lugares, desta vez por um habitante de uma cidade com um centro histórico, por sinal classificado como Património Mundial.
Vale a pena ler com atenção e tirar algumas conclusões:



“Querem tirar a alma a Évora?Meses atrás, num dos meus passeios nocturnos, deparo, à distância, com o que me pareceu ser uma qualquer festarola de habitantes de bairro, reunidos à volta de uma mesa…chego-me ao grupo e reparo que, sendo festa, que também o era, mais seria a reunião de uma qualquer corte, podendo-lhe também chamar feira de vaidades. Pois lá estava um senhor todo de preto vestido que discursava sobre um excelente projecto de reabilitação, salvo erro daquele bairro, um conjunto de maquetas que se podia “visitar” enquanto outro senhor as descrevia a um grupo de congratulados cortesãos, as forças vivas da noite, embora predominassem as cores claras.Da plebe, pouco ou nada, não se dava por ela. 3 ou 4 circunstantes, eu incluído e de passagem. À pergunta do sr que com prazer e notória autoridade presidia à sessão da corte, se haveria algum comentário, um plebeu demanda-o sobre as suas torneiras e porta do quintal (salvo erro). Foi encaminhado pela majestática figura para o presidente? da câmara que lhe resolveria o problema…espero que tenha sido a contentoOutro circunstante ousou realçar o facto de a populaça não ter sido conveniente e atempadamente chamada à audiência. Foi negado o facto por membros da corte. O ar decadente daquilo tudo…A mim, pareceu mais uma feira de vaidades à velha portuguesa, em que meia dúzia de cavalheiros se reúnem para se auto-congratularem e se darem, mutuamente, ao prazer de coçarem o ego a cada um, saberão eles porquê.Arrepiou-me, isso sim, ouvir duas daquelas personagens comentar o facto de para fazer uma rua por ali, deitar uns prédiozitos abaixo. Sei que é feio ouvir conversa alheia, mas até me deu ideia que seria importante para aquela gente, que alguém sentisse, por um momento, a importância de eles estarem ali e o poder que detinham.E lembrei-me disto porque, não há muito tempo, tive oportunidade de ver outra maqueta. Da CâmaraAcrópole XXISe da outra pouco vi, com esta recreei-me.Acho que é um excelente projecto se retirarem do centro do modernaço, o Templo de Diana. Fica ali perfeitamente deslocado.Se não, vejamos. Há dinheiro para gastar e tem de ser gasto. Obra tem de ser feita. Évora deverá ser a única cidade com rotundas quadradas. Continue o Sr. que sei agora ser importante e chamar-se Ernesto, a ser original. Leve-se a obra até ao fim…deite-se o Templo abaixo, já que se vai subir o pavimento, e cobrir a seu pódio/base/alicerce faz tanto tempo exposto, afinal só quase completo, e depois com aquelas coisas por cima, muito escaqueiradasTenha a coragem de ficar na história. Sugestão para uma Placa/Memorial em sua homenagem:“Aqui Jaz o Templo de Diana, construído por Romanos incógnitos do Séc. I DC, mandado demolir por mim, Ernesto Augusto, Presidente, circa 2010-2011””O templo tem de ir abaixo.Com ele em pé, esse projecto não passará de um aglomerado de clichés arquitectónicos perfeitamente vulgares, datados, ultrapassados, déjá vu, podiam ser empilhados em qualquer lugar, Lego, péssimo projecto em minha opinião, dando forçosamente a ideia de que, havendo um concurso, o júri teria sempre de aprovar qualquer coisa, por muito má que fosse. Bravo júri que tal obra aprova. Deve ter sido mesmo um caso de consciência “noblesse oblige”, sem remorsos, com honra e dignidade. Dinheiro há para ser gasto, obra tem de ser mostrada, mesmo que envergonhe a cidade (La Palisse). Dê por onde der. Aprove-se, sem vergonha ou pesos de consciência. Que durmam sempre descansados.E na mente de iluminados, para evitar apelar à cultura pato bravense, não basta estudar, melhorar o que existe e manter a alma e harmonia de espaços, tentar manter o espírito e traça originais. Substitui-se, por todo o lado, a calçada, por laje de calcário ou granito, coisa modernaça. E quente ao sol de Évora. Abatem-se árvores, acaba-se com um dos dois únicos jardins da cidade. A plebe, a velharia residente vai sentar-se ao sol, em bancos de pedra, poucos, mas quentinhos. (vai ter repuxos?) Terão sempre uma boa, enorme casa de banho, não sei se à dimensão da sua necessidade, (já poucos os velhotes, restarão os turistas em magote a visitar o espaço modernista estilo centro comercial), por certo à medida do ego presidencial/arquitectural.Lindo aquele bar gaiola-de-vidro,-sauna, alcandorado sobre o troço de muralha romana com o tanque para os patinhos, ao lado. Amenizará a temperatura de tanta pedra a reflectir e armazenar calor. Repuxos? Poderemos chegar ao muro e olhar a Norte?Não se entende como desistiram do estacionamento subterrâneo e mantêm a porta romana abaixo, que nem sequer se vê do bar e a malta que passa por lá, não liga.. Desperdício. Gostei da vontade, talvez oculta, mas eu percebi, de promover o ciclo-turismo ou o uso de Segway, ao implementar sentido duplo em algumas das ruas limítrofes. Boa malha. Se não houver Clientes para as bicicletas, que o Povo mandria e está a ficar velho, amanda-se-lhes com os autocarros para rentabilizar os sanitários.Se optam por não melhorar o que está, se optam por acabar com os jardins da cidade, se optam por lajeados, verdadeiros disparates, (aquele em frente da fundação Eugénio Almeida também fica bem se deitarem a Sé abaixo, assim destoa, aquilo é mais entrada de Hipermercado ou monte alentejano de novo rico), estão a roubar a alma de Évora, estão a roubar-lhe a individualidade, personalidade, a sua identidade, estão a roubar o que a torna única. Mas será que ninguém vê que aquilo é um desastre ?.Tenha termos presidente, esta Cidade não é seu quintal para a andar a forrar de mau gosto..Não a mascare, disfarce só um pouco as rugas que lhe dão dignidade. Não torne a Velha Senhora, numa qualquer Lolita.Este projecto Acrópole XXI, só mostra que, mesmo ganhando as eleições, o sr. não gosta, nem merece a cidade.E chamam-lhe progresso? Estranha gente esta
Da Cultura e seus responsáveis locais(…)”

Por António Souto, 28 de Outubro 2009
in http://evorapatrimoniomunicipal.blogspot.com/

4 comentários:

  1. "...O projecto de resolução do PSD que recomenda ao Governo o fim da divisão da carreira em duas categorias e a criação de um novo modelo de avaliação no prazo de 30 dias foi hoje aprovado pela Assembleia da República.

    O PSD recomenda ainda ao Governo, no seu projecto de resolução, que no primeiro ciclo avaliativo que está a terminar não haja professores penalizados em termos de progressão da carreira devido a diferentes interpretações da lei.

    Inviabilizados, pela abstenção do PSD e a rejeição do PS, foram os projectos da restante oposição para suspender o actual modelo de avaliação e acabar com a divisão da carreira dos professores.

    O PS já tinha anunciado que iria viabilizar apenas o projecto de resolução do PSD, votando contra os outros sete diplomas apresentados pelo CDS-PP, BE, PCP e PEV. Com o voto contra do PS e a abstenção do PSD, estes foram chumbados..."


    Este é um exemplo que, quando não impera arrogância e a prepotência, com diálogo pode-se fazer mais e melhor...infelizmente nem sempre assim é,infelizmente.

    João Neves

    ResponderExcluir
  2. Este artigo sobre o caso de Évora faz lembrar outros que aqui foram também publicados e discutidos sobre o caso Almeida. Até nos ingredientes: feiras de vaidades, festarolas, construções disparatadas, bancos de pedra vazios ao sol, repuxos, população alheada e arredada das decisões, turistas aos magotes em praças vazias… a própria ameaça à “alma” da cidade!

    Pelos vistos os nossos autarcas andam todos com as mesmas manias. Desperdiçam o dinheiro, arranjam sempre uns quantos para bater palmas e ainda ficam convencidos que estão a fazer um grande papel. O povo, concorde ou discorde, lá no fundo é sereno e deixa. Marimba-se para o único recurso que têm. Quem vier atrás que feche a porta. E agora que tornaram a ganhar as eleições, ninguém está para se chatear. Deixe lá, Dra. Clarinda, sabemos que gostaria de ver uma evolução diferente, mas aqui está tudo muito caladinho. À espera das próximas bifanas ou a ver do emprego prometido. Está na cara que pouco importa o Património da Humanidade. A gamela dá de comer a quem empurra os outros. Pelo menos, enquanto deixarem. Cada um tem aquilo que merece.

    ResponderExcluir
  3. Apesar de demonstrado publicamente o interesse político nesta matéria, infelizmente não tem havido a preocupação técnica de informar a população de forma clara acerca dos investimentos já realizados ou previstos neste domínio, talvez mesmo por não existir uma planificação concreta e expressa ao nível do plano de actividade e respectivo orçamento.
    Parece haver necessidade de uma estratégia de comunicação social que reflicta não apenas os actos e decisões camarárias, mas que vá dando sentido e continuidade às informações e sobretudo que se invista também numa operação de informação que não seja só eleitoralista, superficial e redutoramente "um prato acabado". Este alargamento de informação deverá suscitar, sempre que possível, algum raciocínio e que a massa crítica da população se manifeste.
    Seguidamente, coloca-se a questão no seguinte: Haverá tradição por aqui de proceder cuidadosamente face aos valores patrimoniais? Em parte sim, já que a própria legislação assim o obriga. Será que de outra forma, haveria interesse em manter e recuperar criteriosamente?
    Vejam-se algumas intervenções, cuja legalidade não se discute, mas sendo cidadãos atentos e por este assunto estar no domínio público, nos podermos permitir, em liberdade, considerar como pouco criteriosas, senão mesmo gravosas, do ponto de vista estético e defensivo dos valores preexistentes.
    Existem casos conhecidos, e, por vezes ventilados na imprensa, de situações de agressão urbanística quer extra muros, quer mesmo no coração da vila (casos de casas reconstruidas com ampliações em altura, demolições e reconstruções sem respeito pela volumetria primitiva, etc...)
    Não pretendendo desconfiar dos eventuais pareceres técnicos, embora tenhamos que ter cuidado porque corremos o risco, pelos mesmos motivos, de ter de demolir e reconstruir uma grande parte da vila.
    Tem igualmente havido o interesse em estudar as potencialidades de alargamento dos serviços de apoio a este sector do mercado associado ao patrimonio? O que vemos, são turistas a entrar e a sair apenas com o que vêem, e nunca deixarão de ser visitantes para passarem a ser utentes. A oferta é de tal forma desajustada com os interesses de um mercado de "turismo cultural" que, na prática só trazem encargos à autarquia e sem contrapartidas materiais e de desenvolvimento.
    Aceitar todas as questões, por elas serem fundamentais para elaborar uma conciência mais abrangente torna-se cada vez mais urgente. Terá de ser defenido com o maior rigor possível, uma proposta de trabalho, informações regulares aos cidadãos dos objectivos e dos montantes de investimento, considerando sempre que o mesmo assunto poderá ser objecto de discussão e reflexão.
    Sem estas condições, não há Alma que resista.

    ResponderExcluir
  4. Maria Clarinda Moreira25 de novembro de 2009 às 00:02

    Caro(a) DcL,

    Bem-haja pela participação de qualidade associada ao post.
    No caso específico de Almeida, o que vimos defendendo, desde há muito, é a necessidade de um estudo interdisciplinar do seu tecido histórico urbano, como instrumento de apoio à criação de um Plano de Pormenor visando não apenas a salvaguarda como a valorização do património. Esse estudo interdisciplinar permitiria ajudar os munícipes a compreender melhor o seu bem comum, procurando ainda evitar o alastramento de arbitraridedades na apreciação ou concretização dos projectos de recuperação ou construção dentro do perímetro amuralhado. Nenhuma perspectiva unilateral deveria, por si só, ter a possibilidade de se sobrepor ao interesse do conjunto histórico, como indesejavelmente tem acontecido em Almeida.

    Por outro lado, foi ainda em tempos proposto ao anterior executivo, a criação de um gabinete municipal que ajudasse os munícipes na orientação e, se eventualmente fosse esse o desejo ou necessidade do proprietário, na concepção do próprio projecto de recuperação do imóvel, mediante um compromisso de efectiva ocupação para fins habitacionais ou empresariais. Evitaria aos interessados a saga desmotivadora de andarem de Herodes para Pilatos, pagando projectos que, por vezes, nunca conseguiriam ver aprovados. Essa proposta, ainda mal formulada, não colheu o entusiasmo dos técnicos presentes, permanecendo assim a indefinição, falta de apoio e até de incentivo aos habitantes para recuperarem os imóveis degradados, situação que permanece até aos dias de hoje, sem que nada de consistente tenha sido feito.

    Não está em causa a defesa do imobilismo, bem pelo contrário, o desenvolvimento integrado que se coadune harmoniosamente com o todo pré-existente. Há muitas cidades e vilas históricas que o fazem, não se compreende que Almeida não tenha essa preocupação. Ainda hoje continua a ser um mistério para os almeidenses como é que foi possível construir um edifício tipo contentor num local tão marcante de enorme coesão arquitectónica, enquanto noutros casos se impediu ou se sancionou a construção de um quarto-de-banho, por exemplo, que em nada de significativo feria a volumetria ou a envolvente.

    Pior de tudo, é a falta de ambiente e condições para se debater abertamente os problemas que todos sabem que existem, a ponto de nem um simples seminário, palestra, workshop, debate… o que quer que seja, se realize, apesar de também há muitos anos se vir a insistir com essa necessidade. Recordo que o último debate que se efectuou neste âmbito, e sem qualquer tipo de intervenção política, portanto meramente cívico, decorreu nos anos 80, creio que 1987 ou 1988, já lá vão cerca de 20 anos. E lembro-me bem que nesse debate, toda a gente pôde falar livremente, queixando-se das dificuldades em recuperar as suas casas, questionar os presentes sobre exigências que consideravam fundamentais. Veja-se hoje, por contraste, as condicionantes que obrigam as pessoas a participarem maioritariamente como anónimas, num blogue como este que procura discutir os problemas que afligem ou preocupam os cidadãos, com medo de represálias.

    Também, aos poucos, começa a não haver ninguém interessado em discutir o que quer que seja, a vila está a morrer aos poucos, despovoada, sufocada de pasmo e receio de falar! Talvez quando não houver ninguém, se torne uma maravilha para alguns poucos arquitectarem uns condomínios fechados onde os turistas se poderão instalar aos fins-de-semana. Haverá Alma que resista?

    ResponderExcluir