Curiosa e irónica coincidência, na ocasião da divulgação do
património histórico de Elvas ser reconhecido como Património Da Humanidade
pela Unesco, em Almeida inaugurava-se com pouca pompa e circunstância um
deslocado, caro e intrusivo memorial num
“arranjo” do Largo 25 de Abril, hoje conhecido (como ouvi a um transeunte) por
Largo da Pedreira, invadindo o espaço da Praça-Forte e ensombrando a primeira
Porta da S. Francisco.
Assim se desbaratam os dinheiros públicos, cerca de 1 milhão
de euros, em obras espúrias e empobrecedoras do património histórico, quando há
tanto para reconstruir e conservar no Monumento Nacional que são as Muralhas de
Almeida, incluindo interiores e envolventes.
Qual a razão de mais um exemplo deste tipo de “arquitectura
desgarrada” de que Almeida é fértil, principalmente nestes últimos anos? Os
exemplos, infelizmente vários, incluem a decoração da porta em jeito de estação
de metro, pirâmides envidraçadas sobre a Porta de Stº António, o tristemente
famoso “mamarracho”, na Praça da Liberdade mesmo nas ventas da Câmara, parede e
chaminé em falso alçado na antiga Praça de S. Vicente, actual Praça Dr.
Casimiro Matias, a intervenção desfigurada nas casamatas com esplanada e monta-pratos
(mais parecendo uma latrina de obras), e é claro sem qualquer utilidade… enfim,
outras um pouco por todo lado, com desarranjos de toda a espécie e profusão.
Os exemplos referidos não acrescentaram qualquer valor a
Almeida. Pelo contrário, constituíram delapidações no património construído impostas
ao que foi uma praça-forte antes preservada no seu todo, razão da sua valia
original.
Os poderes instituídos, particularmente os gerentes
camarários, ávidos de “deixar marca” para a posteridade e arvorando eficiência a
candidaturas de fundos comunitários para garantir comparticipações que todos
temos de pagar, empobrecendo-nos de qualquer forma, com deficit cultural, bom
senso e bom gosto insuficientes, parecem gostar da maviosa música que
diplomados contratados lhe vão tocando aos seus pouco educados ouvidos,
impingindo-lhes sinfonias de mamarrachadas, em roupagens de modernidade com um suposto integracionismo
arquitectónico, mas que não passam de exemplos
de mau gosto num pastiche
aparolado. Adiante.
…..
Os almeidenses, infelizmente, deixaram de ter sensibilidade
para questões de brio no seu património e, como a Câmara é a maior empregadora
do concelho, pensam que os seus gestores a não serem eleitos, eles, os votantes
e seus familiares, deixariam de ter emprego… Assim, agachados e anestesiados na sua
vontade, os tempos vão passando e a Praça-Forte cada vez mais incaracterística
vai ficando. A última obra-prima é uma
ciclovia em redor e furando a Estrela, invadindo a zona de protecção ao
monumento, com quilómetros de guias em granito, por vezes mesmo em duplicado (pois
claro, o granito nunca pode faltar), num traçado por onde todos os dias circularão
centenas senão milhares de ciclistas… E óbvio, o que é “vendido” aos leigos … é
que se trata de um enorme benefício, uma inteligente negociação com a EDP,
agora também dos chineses, quem sabe virão pedalar por ali…
Fácil é gastar o dinheiro dos outros (ou seja, dos nossos
impostos). Difícil é geri-lo de forma criteriosa e efectivamente útil. Recomenda-se aos decisores camarários e outros
quejandos que têm subscrito tanta barbaridade, um curso de economia elementar,
já! E à maioria dos almeidenses que abram bem os olhos… pois, numa atitude a
roçar a patetice, são quem tem permitido todo este desvario que nos empobrece a
olhos vistos. Enquanto uns são classificados pelo seu património por restaurar,
Almeida fica embasbacada a ver calhaus novos amontoados a deitar água… e à
espera que uns esplendorosos candeeiros dêem maracujás…
Rui Brito da Fonseca