20 setembro, 2013

Despedida de Assembleia Municipal - parte 4 (fim de intervenção)



Não, meus senhores, não é ódio. Estas atitudes não me merecem ódio. Somente desprezo e um pouco de indignação, junto com estupefacção por tanta submissão e indiferença. Pensem o que quiserem da minha modesta posição de “andorinha que, sozinha, não faz a Primavera”. Fico tranquila, pois não tenho a veleidade de convencer ninguém; no entanto, sabemos que inevitavelmente a Primavera chegará, pois os ciclos têm isso de bom: giram ao cabo de pequenas ou grandes mudanças. E para a transformação basta um pequeno impulso! Do meu insignificante papel, apenas opto por não me deixar intimidar, antes exprimir uma discordância frontal, já que o que predomina são atitudes de abuso de poder, que fazem com os que aqui vivem temam o jugo no cachaço, ou então o pau com um fueiro para espetar o coiro. Mas assim, nunca irão a lado nenhum! Fora de Almeida, chega-se a apontar-se algumas atrocidades, alguns criticam o que chamam de “parolices”, mas apenas à distância, porque pela frente não dizem nada e, no fundo, ninguém mexe uma palha, porque “é lá com eles, com os almeidenses” – enquanto Almeida desaparece nesta voragem de interesses e cobardias! Se contam com os de fora, estão bem tramados!

Antes de estar nesta AM, decidi escrever num blogue [Fórum Almeida] aquilo que pensava, acreditando que ajudaria outras pessoas a deixar de ter medo. Isso passou-se há mais de quatro anos e, como se aproximavam eleições, qualquer agitação podia fazer perigar a reeleição para manter a situação. Resultado: assisti impotente como muitos ao encenar de todo o aparato de candidatura à Unesco, que resultou naquele fracasso que todos conhecemos. Em Almeida, vi as pessoas idosas a ser levadas na sua boa fé em procissões e romarias a visitar as Casamatas, que depois de se ter gasto um balúrdio para ficarem impermeabilizadas, continuam com infiltrações, como seria de esperar e como técnicos qualificados advertiram, para não falar naquela esplanada ao relento, com um ridículo elevador de monta-pratos que nunca funcionou, como tantas obras feitas em Almeida, que depois ficam para os cardos e vandalizações. 

Vi também fogos-de-artifícios espectaculares como raramente vejo numa grande cidade, de tão dispendiosos que são. Seguiram-se anos de vacas magras, “por causa da crise”, mas ao que parece, em ano de eleições outra vez, a crise já passou, pois torno a ver festa rija, nos vários quadrantes e durante muitos dias. Ano de eleições, pois então! Não lhes tiro o chapéu, pois governar assim não é difícil: como dizia a cantora: “Demagogia, feita à maneira,/ É como queijo numa ratoeira” – e os ratos atracados somo nós…

Aceitei vir para uma AM na condição de falar claro, já que dizem que os blogues não chegam aos olhos das pessoas. Mas aqui também não parecem chegar, nem aos ouvidos. Por isso, não vou continuar. O jogo está montado para continuar neste levanta-braço e siga, vai de roda, está aprovado, mesmo que ladrem, a caravana passa. O povo quer e é enganado com festas e promessas… e de quatro em quatro anos assiste-se ao mesmo. Mesmo que Almeida esteja a agonizar, porque no dia a seguir às festas vai-se tudo embora e Almeida, sede e concelho voltam a ficar desertos e entregues à sua tristíssima sorte, degradando-se dia após dia, sem condições para a população se fixar, depois de tanto dinheiro gasto.

 Sr. Presidente, meus senhores e senhoras, despeço-me, pedindo desculpa pela morosidade da minha intervenção, mas foram quatro anos para meter nestas miseráveis páginas, escrevinhadas, com muita pena de não conseguir acreditar em condições de poder fazer mais por Almeida, terra de antepassados, que ensinámos filhos e amigos a ter sempre no imaginário e no coração, terra onde nos esforçamos, e bastante, por recuperar um tecto para não nos desprendermos das raízes e darmos se possível algum contributo, mas onde agora nem gosto tanto de estar, por tanta desolação e fantochada. 

Estes anos foram uma experiência dura, mas também madura. Por isso, não guardo ressentimento e reconheço até o seu lado de distanciamento e alargamento de perspectiva. Assimilo-o, e continuo seguindo um caminho, que é diferente deste. Não lamento o passado, nem o tempo aqui investido, pois agi sempre em consciência e lisura. A todas as questões referidas, dispenso resposta, pois foram por mais do que uma vez debatidas, e estou certa que esta AM tem coisas mais urgentes para fazer. Já ouvi diversas vezes nas minhas intervenções, que essa é a minha opinião e que fique com ela. Eu fico. Quero apenas despedir-me com um apelo a todos os presentes que façam também um exame à sua própria consciência e abram bem os olhos ao que está na frente do nariz, de forma bem objectiva para tomarem a decisão que acharem certa no momento certo. Bem-hajam!

16 de Setembro de 2013
Maria Clarinda Moreira

19 setembro, 2013

Despedida de Assembleia Municipal - parte 3



Contudo, os poetas autores daquelas palavras ficariam destroçados se soubessem que as suas palavras de liberdade se tornaram ocas e usadas de forma muito hipócrita numa terra que chega a negar o uso da palavra a um membro, eleito pelo povo como seu representante, e por sinal bem tarimbado no serviço à causa pública, precisamente numa cerimónia de evocação do Dia da Liberdade – e isto sem qualquer motivo de força maior, ou até menor. Pura e simplesmente, nega-se e pronto, “sou eu que decido, e eu é que mando” – sendo esta a noção de liberdade que os dirigentes democráticos têm neste município e, suprimindo, se possível, da acta a afronta.

Ou então, como daquela vez em foi mandado evacuar a sala para abafar o escândalo de um livro pago com dinheiros públicos estar a apodrecer numa garagem, quando poderia estar a ser convertido em saldo positivo de contas, só porque tem um agradecimento considerado errado por quem manda, quando lá bastaria colocar uma errata se quisessem corrigir um erro, que não o é, porque o autor designa em espanhol aquilo que vulgarmente no seu idioma considera “coordenadora”, como a pessoa que sempre tratou directamente com ele, com autorização e até indicação expressa do executivo, para que doasse o seu trabalho a Almeida. No entender do executivo, o que antes era digno dos mais rasgados elogios, agora é um erro –  chegando ao desplante de ser afirmado publicamente “enquanto eu for Presidente de Câmara, o livro não será posto à venda, quem vier atrás de mim, faça dele o que quiser” – e assim uma simples página de agradecimento, sincero e honesto, serve de reles argumento para que uma edição explicitamente preparada com todo o carinho para comemorar o Bicentenário das Invasões francesas, e um custo de quase 5.000 €, valor que daria tanto jeito ao menos para reparar uns buracos numa estrada, permaneça inexplicavelmente censurada em pleno século XXI, dito de democracia livre.


Não, meus senhores, não é ódio o que me levou a levantar a voz de protesto. É antes amor por Almeida, que não aceita injustiças deste calibre e sobretudo tão mesquinhas. Em tempos, uma pessoa mais velha, bem traquejada nestas lides políticas que fazem o dia-a-dia do concelho de Almeida disse-me: “O actual Presidente é como um eucalipto. Grande, possante, mas que suga com as suas raízes a água toda das outras árvores - e seca tudo à sua volta”. Essa frase ficou-me gravada e deu-me muito que pensar. De facto! Quase me obriga a pedir desculpa aos almeidenses pela boleia de imagem com que contribuí, dentro e fora, pedindo a todas as portas a que batia que colaborassem com alma por Almeida, porque o presidente em nome do qual falava, tinha condições de fazer um trabalho diferente, sendo ele experiente na gestão autárquica e determinado a imprimir um novo fôlego na dinâmica do concelho. 

Sim, até dá ar disso. Mas quando cai o verniz, cai como se diz, o Carmo e a Trindade em ameaças e vociferações, ai de quem o contrarie, porque logo o cortante “eu não lhe admito” se virá a transformar num extenso relambório justificativo de quem tem o uso e privilégio de antena! Bem sintomática é a sua expressão de marca: a palavra “desafio”, que lança a torto e direito, como quem está sempre em posição defensiva ou de ataque e nunca confiante. A História está carregada de padrões desses, que degeneraram em ditaduras. Não é preciso procurar muito para saber que o poder transforma aqueles a quem sobe à cabeça, procurando espezinhar quem se atreva a contestá-las, dando abrigo a descaradas assumpções de que “nos milheirais comem os pardais” – quem quiser, é assim, senão que se lixe!
 
(Continua...)

18 setembro, 2013

Despedida de Assembleia Municipal - parte 2



Para quem não sabe, a ideia da Recriação Histórica do Cerco de Almeida, que agora enche os écrans do país, mas serve também de mera propaganda interna, nasceu na nossa casa, longe de qualquer ribalta, ou desejo dela, num dos muitos serões de entusiasmo e saudades do potencial que sonhávamos para esta terra; estamos, deveras satisfeitos pelo êxito da ideia, embora isso não signifique pela sua forma de concretização, e observamos todos os anos o seu crescimento, sorrindo da distância que separa a apresentação da proposta ao edil de então, e o mesmo de agora, que recordo ainda argumentou “e quem é que veste as fardas?”, tendo eu respondido alegremente “tenho lá três soldados em casa, mais colegas de faculdade dos filhos… mas o importante é que se envolva as pessoas daqui” – o que foi conseguido sem qualquer dificuldade, vencidas as primeiras resistências.

Recordo esse facto para sublinhar que, após o decisivo impulso de arranque, fomos nós que nos quisemos afastar – e não o contrário, e não por despeito ou frustração de interesses particulares, como foi propalado, mas apenas porque “quem não se sente não é filho de boa gente”:  neste mesmo salão nobre, sem qualquer atitude reparadora, calmamente aguardada durante meses, fomos publicamente insultados por um consultor contratado, o arq. João Campos, a propósito da sua intempestiva defesa do mamarracho aqui defronte, de que agora todos parecem esquecidos, chegando a qualificá-lo de “jóia, bijou e preciosidade”. Hoje, após uma frustrada tentativa de perseguição judicial que nos visava silenciar, e a que vergonhosamente o executivo prestou colaboração, permanece o mesmo técnico como o responsável de quase todas intervenções e outras bizarrias arquitectónicas que o município tem subscrito e pago, ao que parece, sem pestanejar, com o argumento que são obras comparticipadas – ignorando que a comparticipação e não comparticipação somos sempre nós, contribuintes, que pagamos, com os pesados impostos a que estamos cada vez mais sujeitos pelo estado a que o país chegou, com obras inúteis, fora interesses em torno delas. 

Sentimo-nos aliviados pela nossa atempada decisão de afastamento, porque assim não temos o rabo trilhado. O povo murmura para aí que tanta floresta de candeeiros e tanta obra em granito e outras pedras que não da região, em paletes amontoadas e usadas, às toneladas e por quilómetros, servem para cumprir projectos desenhados pelos próprios interessados, com empresas de familiares ou amigos a lucrarem, em troca de apoio político… mas eu não sei, parece que ninguém sabe, ou faz que não sabe, porque se fosse assim chamar-se-ia corrupção ou máfia, que é o nome que se dá quando uns poucos beneficiam em prejuízo de muitos… mas o que é certo é que esse tipo de obras e projectos proliferam como cogumelos e, quanto mais não seja, só por si são já na maioria das vezes profundamente lesivas, pela destruição da autenticidade histórica, que é um bem colectivo que todos temos a obrigação de legar às gerações próximas, e não esta vulgarização de vilas e aldeias antigas que desatam a imitar os aglomerados do litoral, com direito a programas de televisão, pagos a peso de ouro, a impingir a ideia de que este é o rumo certo, basta meter os pés na água para tirar o cheiro a chulé, e aqueles poemas enaltecendo a liberdade a testemunhar que tudo vai às mil maravilhas…

(continua)

17 setembro, 2013

Despedida de Assembleia Municipal - parte 1



Começo hoje a publicar aqui o texto que apresentei na AM de Almeida como despedida dos meus trabalhos naquele órgão no dia 16 de setembro. Calculo o pouco interesse que tenha para uma grande parte dos almeidenses, conformados e indiferentes que estão quanto à situação política do seu concelho, apesar do início da campanha eleitoral que hoje começou. Mesmo assim, achei que devia dar-lhes conta do esforço, que em boa verdade quase considero debalde pelas razões que facilmente adivinharão, de assídua participação e intervenção pessoal nas sessões da AM, durante o mandato que termina, conforme confirmarão pelas actas, por muito condicionadas que sejam!

Dada a extensão do texto (são 4 anos em perspectiva...), este será repartido em partes, até à sua conclusão, pois não tenho outra possibilidade de comunicar com aqueles almeidenses que eventualmente esperam alguma satisfação do que foi o empenho assumido em sua representação. 


Exmos. Senhores,

Sendo previsivelmente a última vez que participarei nesta AM, quero fazer uma reflexão sobre este meu acto cívico de, juntamente com outras pessoas, defender pontos de vista para a defesa dos interesses de Almeida. 

Começo por agradecer aos colegas de bancada o convite que há quatro anos me foi feito para assumir um compromisso de que falaria sempre de acordo com a minha própria opinião, já que previamente deixara claro que não seria por motivações ideológicas ou partidárias que aceitava integrar a sua lista. Em abono da verdade, registe-se que o PS, bancada de que fiz parte e à qual coube o papel de oposição em minoria, nunca esboçou qualquer tentativa de me pressionar para um enfileiramento de opinião ou sentido de voto, como todos puderam sobejamente verificar. Nisso, não só cumpriram escrupulosamente a condição acordada como souberam dar uma demonstração de respeito efectivo pela pluralidade de opinião que junto de mim afirmaram defender! 

Mas não é de partidos que quero falar. Acedi tornar-me membro desta Assembleia no mandato que agora termina, porque discordava profundamente do rumo que Almeida decidira traçar para este concelho, em particular para a sua apregoada “Estrela do Interior”, que tem levado tratos de polé nos últimos anos, com desperdício de recursos e oportunidades de bradar aos céus. Essa discordância total, que não dissimulo, serviu inclusive para uma propalada justificação de ódio pessoal contra a pessoa que dirige os destinos desta Câmara, com base num alegado despeito por não ter continuado uma colaboração anteriormente prestada, envolvendo a família e amigos, num esforço de dinamização cultural para uma maior visibilidade da importância histórica de Almeida. Esperava que ajudasse a tirar o Concelho da estagnação e opacidade em que há muito estava mergulhada. Na altura, acreditei que era possível - e bati-me a fundo por isso. 

(Continua...)