11 novembro, 2011

...uma força a crescer-me nos dedos e uma raiva a nascer-me nos dentes...



Sr. primeiro-ministro, depois das medidas que anunciou sinto uma força a crescer-me nos dedos e uma raiva a nascer-me nos dentes, como diria o Sérgio Godinho. V.Exa. dirá que está a fazer o que é preciso. Eu direi que V.Exa. faz o que disse que não faria, faz mais do que deveria e faz sempre contra os mesmos. V.Exa. disse que era um disparate a ideia de cativar o subsídio de Natal. Quando o fez por metade disse que iria vigorar apenas em 2011. Agora cativa a 100% os subsídios de férias e de Natal, como o fará até 2013. Lançou o imposto de solidariedade. Nada disto está no acordo com a troika. A lista de malfeitorias contra os trabalhadores por conta de outrem é extensa, mas V.Exa. diz que as medidas são suas, mas o défice não. É verdade que o défice não é seu, embora já leve quatro meses de manifesta dificuldade em o controlar. Mas as medidas são suas e do seu ministro das Finanças, um holograma do sr. Otmar Issing, que o incita a lançar uma terrível punição sobre este povo ignaro e gastador, obrigando-o a sorver até à última gota a cicuta que o há-de conduzir à redenção.


Não há alternativa? Há sempre alternativa mesmo com uma pistola encostada à cabeça. E o que eu esperava do meu primeiro-ministro é que ele estivesse, de forma incondicional, ao lado do povo que o elegeu e não dos credores que nos querem extrair até à última gota de sangue. O que eu esperava do meu primeiro-ministro é que ele estivesse a lutar ferozmente nas instâncias internacionais para minimizar os sacrifícios que teremos inevitavelmente de suportar. O que eu esperava do meu primeiro-ministro é que ele explicasse aos Césares que no conforto dos seus gabinetes decretam o sacrifício de povos centenários que Portugal cumprirá integralmente os seus compromissos — mas que precisa de mais tempo, melhores condições e mais algum dinheiro.

...assim não vale...
Mas V.Exa. e o seu ministro das Finanças comportam-se como diligentes diretores-gerais da troika; não têm a menor noção de como estão a destruir a delicada teia de relações que sustenta a nossa coesão social; não se preocupam com a emigração de milhares de quadros e estudantes altamente qualificados; e acreditam cegamente que a receita que tão mal está a provar na Grécia terá excelentes resultados por aqui. Não terá. Milhares de pessoas serão lançadas no desemprego e no desespero, o consumo recuará aos anos 70, o rendimento cairá 40%, o investimento vai evaporar-se e dentro de dois anos dir-nos-ão que não atingimos os resultados porque não aplicámos a receita na íntegra.

Senhor primeiro-ministro, talvez ainda possa arrepiar caminho. Até lá, sinto uma força a crescer-me nos dedos e uma raiva a nascer-me nos dentes.




Nicolau Santos, Expresso, 15/10/2011




2 comentários:

  1. Ora aí está um artigo que vem alertar que nem as capicuas da sorte do 11/11/11 nos estão a valer. Qual sorte, qual carapuça! Só se for a dos barretes que nos enfiam uns atrás dos outros.
    Parece que além disso o S. Martinho nos trouxe uma "castanha" que nos vai rebentar nas mãos...
    Mas até lá lá podemos continuar a dormir descansados. Está tudo bem...tudo manso!

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  2. Almeida a património da humanidade!

    As pessoas do poder passam a vida a dizer que são os representantes do povo.
    É mentira!!! Pois eles só lá estão porque mentiram ao povo. Se eles tivessem dito a verdade, provavelmente não estariam lá.

    Alguém consegue ver uma saída desta situação, sem que a população retroceda décadas na qualidade de vida, (praticamente voltar aos anos 60 e à horta quase quem queira comer)?

    Alguém ainda acredita que seja solução o BCE injectar ilimitadamente dinheiro nas economias em pré-bancarrotas, fazendo subir colossalmente as inflações, moedas a colapsar e preços escandalosos nas prateleiras?

    Alguém ainda acredita que seja uma solução escandalosa, segundo parece pelas críticas ao nosso secretário de estado da juventude, mas que para mim só foi pouco prudente por ser sincero demais(até porque não estamos habituados a isso), ganhar juízo e sair do país?

    Os bancos estão a defender-se como podem...se fossemos donos de um banco estavamos a fazer exatamente o mesmo que eles...querem é vender o que têm em mãos...

    A população a envelhecer; as restrições para reabilitação; a população jovem a decair muito depressa; os bancos sufocados com o capital enterrado por todo o país em rotundas e obras feudais, e o estado, miserável, a morrer de fome e a matar o seu povo!

    De norte a sul do país, gruas erguidas por todo o lado, paradas, e casas a venda a crescerem como cogumelos! O mercado imobiliário tinha que implodir, e foi o que aconteceu.

    Alguém ainda acredita que isto se resolve já em 2012, ou em 2 ou 3 anos? Eu não vou nessa...
    Uma coisa é certa Portugal ainda nem sequer começou a descontar.
    Temos neste momento as brilhantes perspectivas futuras de países de ex-união sovietica. Dívida, dívida, dívida...
    Quem tiver algum pode começar a mudar os depósitos para outros países que já será uma brutal vantagem e forma de proteção. Uma geração a estragar para outra(s) pagar. Pode ser que a seguinte possa voltar a usar (a minha já está condenada -e sou novo-).

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